Ao abrir os olhos mais uma manhã, um mundo de
possibilidades aparece diante de mim, mas, vez por outra, não vejo de forma
satisfatória para continuar caminhando (motivado-encantado) na jornada. Assim,
vejo o que já sei e, não me permito ampliar o olhar experimentando a beleza da
vida, da novidade. Sim, a vida também é bela. Isso não significa ser alienado
diante de relações sociais hierárquicas e desiguais que oprimem tantos humanos
em solo brasileiro. Contudo, seja na religião, no partido político, na ONG, na
ciência, na natureza... Há possibilidade de encantar-se e reinventar-se
criativamente e criticamente em favor da vida e do bem comum.
Deste
modo, onde e com que olhos eu vejo o mundo? É possível está olhando e não ver?
Tenho a impressão que o nosso olhar está acostumado e que perdemos a
curiosidade de saber, de conhecer. Nem queremos óculos novos, nem colírio...
Será que precisaríamos perder a visão para enxergarmos melhor? Lembro ao
escrever este pequeno texto do irmão Antista (em memória) da IPU em Muritiba,
acredito que, mesmo deficiente visual, enxergava melhor do que muita gente.
Sempre sorrindo, brincando e abençoando crianças menos favorecidas de nossa
comunidade. O nosso irmão Antista como era conhecido, via sem poder ver.
Ora,
o discurso religioso pressupõe uma missão, uma visão, porém, o que salta aos
olhos é uma prática hegemônica e excludente de grupos que se "apoderam"
de representações do sagrado e, por isso mesmo, pensam que são donos de Deus.
Acabo
de ler o livro de Derval Dasílio sobre Jaime Wright: o pastor dos torturados.
Das muitas impressões e desafios que este livro sinaliza, chamou minha atenção
para a relevância de homens e mulheres que em instituições ecumênicas serviram
a Deus de forma radical. Isto é, salgando-iluminando vidas que diante de
estruturas de morte estavam sendo em nome da ordem, da construção da nação e de
Deus, sendo moídas como a cana na máquina de moer, mas, onde estava a doçura
neste contexto? Se for possível esta leitura, penso que elas estariam nos laços
de companheirismo estabelecidos nos porões da ditadura militar. Sendo assim,
homens e mulheres promoviam a justiça e o direito à vida de forma profética
impulsionados por fé, por ideologias, por sonhos de uma nação mais igualitária
nas relações sociais.
Cabe apontar que não estou negando o campo
religioso enquanto um campo de disputa, pois, seria muita inocência para um
estudante de Ciências Sociais. Entretanto, interessa-me problematizar os
esquemas e interesses que nos separam e, vez por outra, nos aproximam. Evidente
que cada grupo social possui seu ethos, mas, isso nos impede de refazer o olhar
em um exercício de alteridade que dignifica o humano. Sim, sei que cada palavra
apontada aqui possui significados distintos para saberes específicos. Daí, a
defesa de que os grupos religiosos precisam dialogar não só com outros grupos
religiosos, mas, com outros saberes.
De
fato, o que vejo hoje é diferente do que um dia meus olhos contemplaram... Por
que temos tanto medo de mudar? Penso que podemos-precisamos problematizar o que
muda-permanece em nossas relações sociais, pois, não estamos soltos no mundo.
Pensando com Norbert Elias, somos indivíduos-sociais. E, mudar os óculos e ou
colocar colírio significa necessariamente perceber como estamos presos a essas
redes invisíveis onde sofremos e exercemos poder. Ou seja, a religião seria uma
rede diante de tantas redes que estão diante de nós...
Confesso
que a rede da religião (que é plural) tem desencantado bastante minha jornada,
sobretudo quando percebo esquemas em busca de poder e prestígio em nome de Deus...
Porém, tenho colocado meus olhos no sorriso de crianças, na luta de jovens, nos
conselhos e mãos firmes das "velhinhas" da comunidade... Nossa EBD “sem”
monopólio do discurso pastoral, nossas culturais onde a vida está sendo
celebrada, temos "brincado" com Deus com cultos leves e refeições que
fortalecem a comunhão... Confesso também que estas atividades e o sopro do
Espirito têm me encantado, me enchendo de vida... Assim, desejo servir ao
Criador cada vez mais. Não tenho medo de Deus, tenho consciência de um favor
que eu não mereço. Logo, a graça do camarada de Nazaré é o bastante para mim.
Aqui,
olhando com Deus no buraco da fechadura, com curiosidade de sociólogo em
compreender-transformar-celebrar o mundo nosso de cada dia, pois, fé e razão me
seguiram todos os dias da mina vida.
Por: Cláudio Márcio
Muito bom texto irmão! Desafiador e motivador... Me sinto parte dessa luta e fico triste por muitos terem desistido. Mas, ainda acredito na colaboração que pessoas como vc estão dando e me sinto parte disso. Quero caminhar, caminhante no caminho do Nazareno...
ResponderExcluirValeu Jefferson...grato pelas palavras...estamos juntos! Abç!
ResponderExcluirMeu amigo Cacau, sigo com mais desencantos do que encantos. Afastei-me da instituição e por muito tempo nem senti falta. Hoje, mais sereno mas ainda pessimista, confesso que tenho sentido falta das poucas migalhas de cristianismo sincero q caem da mesa farta dos currais religiosos. Estou na busca. Relatos como esse seu me dá um pouco de esperança. Não para me tornar um otimista, claro, pois, já diria Nelson Rodrigues, um otimista é só um pessimista mal informado, mas vc faz parte dos remanescentes. E isso me faz acreditar q ainda é possível caminhar. Obrigado.
ResponderExcluirCamarada Natan, sou grato a vida por te encontrar no caminho...Sim, os desencantos me cercam cotidianamente. Contudo, penso que p/ viver, o encanto faz-se relevante. Bem, onde ele habita? Penso que onde existe vida! Confesso que "ainda" encontro-me preso a um grupo institucional que me acolheu, e isso me acarreta desafios peculiares em minha jornada. Sabemos o peso do grupo religioso nos ombros...mas, tenho experimentado a leveza de um fardo suave. Ou seja, falo do Nazareno que encontro na face de homens e mulheres nas praças e ruas da cidade, no meio da feira e, de vez em quando na igreja. De qualquer maneira, um forte abraço de quem muito te quer bem!
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