O desejo de tecer algumas palavras, que simbolicamente
podem representar essa colcha de retalhos que é a vida, apresenta-se com
bastante intensidade. Falo do "retalho" do café junino que ocorreu
este final de semana (16/06/13) em nossa comunidade (IPU), mas, diante das
mobilizações que estão acontecendo em nossa nação e, tentando oferecer um ponto
de vista para discussão com o meu camarada Rev. Hênio que solicita minha
opinião sobre esta temática olharei para esse outro "retalho" e
abordarei sobre o café junino no próximo texto, beleza? Eis os questionamentos
do Hênio que me foram postos:
“Minhas perguntas são as seguintes (e pergunto
sinceramente): a) não obstante ache que esse movimento possa desembocar sim em
coisas promissoras e propositivas para a população, como isso se relaciona com
o fato de que as mesmas pessoas que hoje protestam são aquelas que elegeram os
políticos que hoje criticam? b) Que se pode esperar, na visão de vocês, em
termos de "reflexos" nas próximas eleições? c) a relação dedálica
entre política (s) e violência (s) em prol de novas políticas”.
Assim sendo, entendo, mas, penso ser necessário
problematizar a comum expressão: O BRASIL ACORDOU! E, aponto por que tal desconfiança.
A) Em que medida as pessoas estão dormindo e ou acomodadas? Nossas relações
sociais ainda que de forma "micro" não são de contra hegemonia e ou
contra poder? B) Reflito a história de forma processual. Isso é, há um jogo de
mudanças-permanências nesses processos. Acredito ser significativa a questão: o
que muda-permanece? C) Por que exatamente agora (com maior projeção) ocorrem essas
mobilizações? Quais as vozes colocadas nessa polifonia? Ou seja, há como
identificar e ou potencializar as vozes de movimentos sociais; partidos políticos;
grupos religiosos; ONGs... Há uma união momentânea em prol do que se entende
como bem comum?
Ora,
abalizo apenas alguns fios diante de tantos retalhos que compõem essa
complexidade de totalidade-conflituosa-integrada. Não posso e nem quero parecer
fatalista e ou incrédulo. Evidente que tudo isso nos faz refletir e de diversas
formas nos convoca a tomada de posição. De que lado estamos? Sei também que
nessa tessitura da colcha de retalhos, alguns fios encontram outros fios
diferentes, o que implica minimamente que as coisas não são necessariamente
isso ou aquilo.
Somos
também movidos por sonhos, ideologias e um desejo profundo de experimentar dias
melhores. Ainda com um pouco de desconfiança, me pergunto se essas ruas e
praças cheias de vida, de símbolos nacionais, de brados de justiça e
enfrentamento pacífico-democrático se alongarão até as urnas.
Evidente
que algo está sendo dito, apontado como fora do lugar, mas, em que medida essas
pessoas que saíram do facebook para as ruas "maior arquibancada do
Brasil" se mobilizariam pelos corpos negros sangrando no chão nosso de
cada dia? Pensando com Edson Gomes (cantor de reggae aqui do Recôncavo baiano),
há "tanta violência na cidade... brother é tanta criminalidade". Isto
é, esse ponto representa mais um retalho.
Como
baiano e nordestino sou estigmatizado como preguiçoso, burro e possuidor de mão
de obra barata diante, sobretudo do sul e sudeste da nação e, alguns podem
pensar que essa questão não é bem vinda agora, mas, quem determina e ou legitima
o momento. Não! Estou de olhos bem abertos e sei que quando esse movimento
perder força, continuaremos aqui lutando debaixo do sol para sermos vistos
também como possuidores de capacidade de reflexividade intelectual e mão de
obra técnica-especializada. Sim, nosso berimbau e tambores continuarão como
símbolo de resistência e celebração cotidianamente.
Sei
que é de extrema importância (também) simbólica esses enfrentamentos todos,
mas, em que medida o país do futebol, da corrupção e impunidade, romperá com
essas estruturas de morte e dominação de elites intelectuais e econômicas se
não entendermos que quando falamos do país, falamos de nós mesmos. Ou seja, lembrando-se
de Norbert Elias, ao se falar da relação entre indivíduo e sociedade em termos
(eu /ela), deve ser substituído por (eu/nós).
Defendo
neste momento pensando com Marx que a tomada da consciência nos livrará da
alienação e provocará a práxis. Assim, nós brasileiros, marcados por múltiplas
identidades estamos mais conscientes ao tomarmos as ruas? Se sim, votaremos e
fiscalizaremos (de perto) os nossos representantes, pois, tenho certeza que
você (leitor) sabe em quem e por que votou nas últimas eleições, não?
Por outro lado, "a revolução
democrática do direito e da justiça só faz verdadeiramente sentido no âmbito de
uma revolução mais ampla que inclua a democratização do Estado e da sociedade”.
(BOAVENTURA, 2011, p.16). Por isso
acredito que tais manifestações fazem parte também de um Direito Achado na
Rua, o qual legitima o pluralismo jurídico e abre o caminho para se
discutir o direito não como algo pronto e acabado, mas sim como um processo, um
vir-a-ser dialeticamente envolvido nos movimentos de libertação das classes e
grupos explorados e oprimidos, os quais cotidianamente sobrevivem e lutam em
meio à contradição social, mas que dela também colhem conquistas. Além do mais,
parte-se da crença na consciência do povo e suas múltiplas estratégias de
resistência frente à frustração perante a sociedade corrupta, injusta,
desigual.
De resto, mas sem pretensões de encerrar o debate, urge considerar
a articulação entre a mudança no cotidiano e a mudança global, as quais se
fazem e refazem nas relações de poder e saber.
Assim, se é indispensável consciência coletiva para uma revolução, ou
seja, para o extraordinário, uma nova ordem societária só será
posta mediante as minúcias do fazer cotidiano, conquistadas mediante os
direitos e a cidadania efetivos. Pois, utilizando-se do pensamento de Faleiros
(2010), se por um lado apostar na mudança geral a partir das micromudanças é
reduzir a política a uma visão reformista, por outro,
considerar o dia-a-dia como mero efeito do sistema é reduzir a política
a uma visão positivista, negando qualquer possibilidade da construção de uma democracia
plena.
Por:
Cláudio Márcio
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