“Todas
as religiões e culturas são respostas ao mesmo mistério fundamental, mas cada
qual percebe-o e responde a ele à sua maneira” (Harvey Cox)
Por:
Cláudio Márcio[1]
Tenho observado com
curiosidade e espanto algumas relações estabelecidas no cotidiano (lugar comum
para um cientista social, não?), assim,
inevitavelmente, sigo rememorando experiências familiares e religiosas que
inculcaram em mim valores e visões de mundo. Lembro de minha mãe e irmãos
realizando o culto doméstico. Lembro da ida para igreja batista na infância e
adolescência aqui no território do Recôncavo da Bahia. Lembro de minha mãe
orando no seu quarto ajoelhada próximo da cama. Com efeito, concordando com
Renato Ortiz “as
recordações não são nunca límpidas, cristalinas, elas repousam no fundo de uma
tela recoberta por camadas superpostas de tinta”.
Desta maneira, a
memória é um construto social em disputa, uma vez que, assim como o velho Raul
Seixas “eu prefiro ser essa metamorfose ambulante”, isto é, dito de outra
forma, Harvey Cox abalizou: “o eu não é uma entidade estática”, assim, mudamos.
Há marcas relevantes na edificação social do meu “eu” e outras que precisam e
ou precisaram de transformações. Mudar, por vezes, dói. Há medo, insegurança...
O “chão nos é tirado”. Penso que é preciso (re)criar-se sempre.
Como
ministro da Palavra e dos Sacramentos na Igreja Presbiteriana Unida, tenho
ampliado minha rede de espiritualidade no mundo ecumênico e nas relações
inter-religiosas. Aqui surge uma dimensão do espanto. Era limitado ao campo
religioso da igreja batista. A leitura de textos no campo da antropologia e a
vivência com outras lideranças religiosas me fazem perceber a relação eu-outro.
O contato com ateus e agnósticos na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia
(UFRB), também me fizeram (re)pensar muitas questões.
De fato, tenho visto líderes ou fiéis
do campo religioso (não apenas cristão) com o mesmo cuidado, empenho, amor e
dedicação que minha mãe tinha (tem) com seus filhos. A ida aos templos e ou
terreiros, a busca da espiritualidade, o empenho em uma sociedade mais justa...
assim como: disputas por poder e
hipocrisia não é um mérito e ou um problema apenas do cristianismo.
Desta
maneira, como cristão protestante da IPU, acredito-defendo que é urgente
trocarmos a percepção de MUROS por PONTES. Sim, somos diferentes. Sim, podemos
sentar-nos à mesa da comunhão. Sabemos que em solo brasileiro, o povo de santo
tem sido demonizado, humilhado, apedrejado e com alguns terreiros incendiados
por cristãos (católicos e evangélicos). Essa realidade apresenta-se de maneira
vergonhosa e lamentável. Sim, posso-devo aprender com o outro. Sim, há perigos
se insistirmos em narrativas hegemônicas, hierárquicas, opressoras e não
dialogais.
Bem, não escrevo para responder. Escrevo para
fazer pensar. Sigo na estrada, pois, o Jesus de Nazaré que creio é caminhante
comigo, ou seja, além de Emaús como sugere a narrativa bíblica, ele caminha
pelo território do Nordeste, da Bahia, do Recôncavo baiano e, não menos na
cidade serrana de Muritiba. Como propõe o cantor-poeta Belchior “pois tenho
comigo pensado Deus é brasileiro e anda do meu lado”.
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