domingo, 5 de abril de 2020

A Quarentena- A Quaresma e os Ramos


Por: Reverenda Sônia Mota[1]

Bendito o que vem em nome do Senhor (SI 118.26)
Pegareis em ramos e vos regozijares (Lv 23.40)

No meio da quaresma- a quarentena!
No meio da quaresma uma pandemia, já prevista pelas comunidades científicas, se instalou no mundo reafirmando o que já havia sendo dito por muita gente de bem: É preciso mudar de nosso estilo de vida autodestrutivo, é preciso acabar com a depredação ambiental, com o consumo desenfreado. É preciso cuidar de nós e da nossa Casa Comum.
Uma quaresma de quarentena e isolamento social. Quaresma estranha... com celebrações, abraços e gestos virtuais, de chorar nossos mortos à distância. Quaresma de medos e inquietações.
Nesta quarentena, descobrimos como a vaidade, a inércia e o descontrole das autoridades que só pensam em si e em como manter os lucros do mercado e o poder colocam em risco a vida de toda uma população. Por isso, a quaresma foi também um tempo de reaprender com Jesus de Nazaré lições de humildade, perseverança, fé e persistência. Encontrar nos seus ensinamentos inspiração e coragem para acreditar na nossa capacidade de não fugir, mas ir em frente, de cabeça erguida, para enfrentar o cerne do problema. Nesta quaresma, petições, pronunciamentos e campanhas pressionam as autoridades para que elaborem leis que protejam o povo neste tempo de pandemia e morte.

Nesta quarentena, aprendemos a temer por nossas vidas e pelas vidas de tantas pessoas que agonizam nas camas dos hospitais. Aprendemos a temer pela vida de tantos profissionais que se dedicam, sem descanso, a salvar vidas. Aprendemos que acúmulo e egoísmo pode ser a diferença entre morte e vida. Que não adianta acumular máscaras e outros equipamentos em casa se eles vão faltar para quem mais precisa. Descobrimos que, embora estejamos com a sensação de termos um vírus democrático que alcança ricos e pobres, é nas periferias das cidades e junto a populações mais fragilizadas que ele fará o maior número de vítimas. Aprendemos a chorar nossos mortos à distância. Mas o tempo da quaresma também nos ensinou a chorar e deixar-nos consolar como Marta e Maria.
Um tempo de sentir a presença consoladora e fiel de Jesus de Nazaré, que sofre e chora com seu povo, e deixar-se consolar por sua humanidade solidária. Nesta quaresma tecemos redes de solidariedade e de apoio às pessoas mais vulneráveis, renovando a esperança e a utopia de que um outro mundo é possível.
Hoje celebramos o Domingo de Ramos! Cristãos e cristãs em todo mundo, ainda que temerosos e marcados pela pandemia, vão rememorar esta semana decisiva na vida de Jesus de Nazaré. 
Relembramos como Jesus de Nazaré entrou na cidade, centro da opulência e da corrupção política, econômica e religiosa, montado em jumentinho, despojado de vaidade e de prestígio, para o confronto que o levaria à morte. Entrou na cidade junto com o povo que não mais aguentava a opressão e o jogo de poder e de vaidade das autoridades. A multidão o recebeu com ramos, tapetes e gritou empolgada: “Hosana”, ou seja, “Salva-nos agora!” Um grito por salvação.
Hoje colocamos ramos nas portas, janelas ou sacadas de nossas casas. Este é o nosso grito por salvação em frente a ruas e praças vazias: “Hosana!!! Salva-nos agora!”
A semana que inicia é uma oportunidade de aprender a escutar o clamor das pessoas desfavorecidas e enfermas, das que choram seus mortos, das que lutam por sobrevivência. Como a mulher de Betânia, queremos ungir Jesus como nosso Messias sem deixar-nos influenciar pelas críticas dos bajuladores. Nesta semana que se inicia, aprenderemos, com Jesus, a desmascarar os manipuladores da Palavra que conclamam os fiéis a se congregarem nos templos como se somente lá pudessem te adorar. A semana da paixão de Cristo desfaz toda a pomposidade da religião do negócio.
Nesta semana que se inicia, queremos aprender com Jesus de Nazaré uma outra maneira de viver, a trilhar um caminho que não passa pela degradação ambiental, pela corrida desenfreada por lucros nem pela suntuosidade dos templos. Um caminho que reconhece a vida como lugar privilegiado da presença de Deus. Nesta semana, queremos aprender, com o Nazareno, a enfrentar traição, indiferença, dor, sofrimento e morte. Queremos aprender a ser sinais de esperança no Deus da Vida em meio aos sinais de morte. Ainda que a pandemia não nos permita celebrar a Semana Santa junt@s, estaremos unid@s em comunhão com todas as pessoas que acreditam que a infinita misericórdia de Deus continua regando o cotidiano da nossa vida e que confiam em que, em meio à morte, sempre haverá um ramo verde de esperança. Temos a certeza de que o amor de Cristo que nos une é mais forte do que a morte! Amém!




[1] Vice moderadora do Presbitério do Salvador.

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