quinta-feira, 5 de março de 2020

Levante-se! Pegue a sua maca e ande...


Por: Cláudio Márcio Rebouças da Silva[1]

            O Dia Mundial de Oração (DMO) nos convida a uma reflexão profunda, pois, se com o período Quaresmal devemos fazer um autoexame, silêncio, orações e jejuns, o (DMO) propõe tudo isso somando ainda com uma práxis emancipadora. O tema escolhido para este ano foi baseado em: "Levante-se! Pegue a sua maca e ande" (Jo 5.8). Assim sendo, lembremos do cantor de reggae do Recôncavo baiano, Edson Gomes, ao dizer: “e tens o direito de ser livre – ninguém neste mundo pode impedir, porém, não espere por esse direito: acorde, levante e lute”.

            Com efeito, João 5.2-9 trata do Jesus que cura, ou seja, a cura física de um paralítico que sofria bastante tempo. Ao curar-salvar, uma nova realidade era estabelecida. O mundo se torna mais alegre e cheio de esperança. Jesus de Nazaré, então, é aquele que aponta o caminho e cura-salva as pessoas marginalizadas no caminho.
            O que esse texto pode nos ensinar? O (DMO) coloca os nossos olhos no Zimbábue localizado no continente africano, todavia, poderíamos também pensar na América Latina com suas opressões e dores, isto é, suas estruturas de morte que produzem na vida de homens e mulheres uma espécie de “paralisia”. Novamente, a imagem do texto bíblico é real, uma vez que, encontramos essas pessoas no caminho que precisam despertar para uma nova vida. “Eis que faço novas todas as coisas” (Apocalipse 21:5) Há, sem dúvida alguma, dificuldades experimentadas em nosso cotidiano e, pela fé, somos desafiados(as) a escutar Jesus de Nazaré nos perguntando: “você deseja ser curado(a)?”
            Carregamos sonhos e utopias. Almejamos as promessas do Senhor de novos céus e nova terra, entretanto, para além de uma perspectiva que joga tudo para um futuro incerto que milagrosamente se resolverá, o cristão ecumênico assume a responsabilidade de salgar e iluminar o mundo. Obedecer a Jesus e fazer brotar o Evangelho é, de algum modo, criar um “alvoroço no mundo”. É viver a fé, a esperança e o amor. É compreender (como aponta Belchior) que “amar e mudar as coisas me interessam mais”.
            É importante ressaltar que a face de Deus a qual devemos conhecer é a de misericórdia. A prática da compaixão em alteridade e empatia. Até porque “não há outra forma de falar sobre Deus a não ser falando sobre nós mesmos. Deus é um espelho no qual a imagem da gente aparece refletida com as cores da eternidade" (Rubem Alves). Estive nu e não me vestiste? Estive com fome e não me alimentou? Fui preso e você não foi me visitar?
Devemos nos lembrar que quando pensamos o contexto africano ou latino americano, não podemos esquecer de um projeto de poder político-religioso chamado de colonização (em tom de cristianização) que controlou corpos e mentes com algemas reais e ideológicas (imagéticas) gerando dor, lágrima e muito sangue.
            Entretanto, engana-se que não percebe a fé, a luta, a resistência, a ousadia, a rebeldia de sujeitos sociais oprimidos e marginalizados. A história tem muitos lados, mas, quem a patrocina?
Também não se pode esquecer que olhando para os profetas bíblicos, o camarada Jesus de Nazaré, é preciso uma tomada de posição. Devemos escolher a vida! Vida plena para os que estão jogados no caminho. A tradição política-religiosa que não garante direitos iguais para pessoas distintas deve ser denunciada e abolida.
            Será que as igrejas têm revelado essa face amorosa de Jesus para pessoas excluídas? Será que ao invés de escutar e perguntar ao próximo sobre suas necessidades, nós já oferecemos respostas a perguntas que não foram feitas? O que significa (para cada grupo paralisado especificamente) toma tua cama, levanta e anda?
Suspeito que para além das igrejas cristãs que se sentem única e exclusivas para o anúncio desse imperativo: pegar, levantar e ir para os outros (sobretudo não cristãos), talvez, o movimento também possa ser inverso, ou seja, é possível que Jesus tenha dito às igrejas através de instituições e ou sujeitos sociais improváveis: “queres ser curada?”. Com efeito, “o Antigo Testamento é cortado por uma briga entre dois grupos: os profetas e os falsos profetas. Os profetas viam as feridas e espremiam seu pus fedorento. Os falsos profetas viam as feridas, mas sabiam que os feridentos não gostavam de mostrá-las. Assim, em vez de espremer as feridas, besuntavam-nas com mel perfumado e diziam: “Está tudo bem!”. O povo amava os falsos profetas e odiava os profetas" (Rubem Alves).
              Uma nova humanidade é estabelecida pelas boas notícias trazidas por Jesus de Nazaré, logo, quem tem ouvidos para ouvir, ouça: levanta e anda!




[1] Reverendo da IPU de Muritiba-BA.             


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