domingo, 31 de julho de 2011

Sou teu senhor...





“Para de manhã anunciar a tua benignidade, e todas as noites a tua fidelidade;”(Sl 92.2)






Pela manhã te buscarei. Mas, como te encontrar?

Estás no canto do pássaro, no sorriso de uma criança.

Na linda canção, no texto lido, na poesia, no abraço fraterno.Encontro-te na oração, na contemplação da natureza.

Encontro-Te nas esquinas e praças da cidade, no meio da feira.

Encontro-Te na diversidade de humanos e culturas.

Encontro-Te onde falam que não estás e às vezes onde me falam que habitas não te encontro!

Estás onde há manutenção do projeto da vida, na voz de sindicalistas, ONGs, MST, movimentos sociais que verdadeiramente almejam justiça social, igualdade e comunhão entre os humanos.

Estás com o violeiro, com a lavadeira, com o militante do amor, da esperança, da alegria.Sei que o que queres de mim é compromisso, dedicação, engajamento, criatividade...Sei que tenho muito a agradecer e por isso quero com minha vida te dar meu louvor.

Sei que quando ando no vale da sombra da morte... Tu estás comigo.

Sei que em Ti eu existo, eu sou justamente porque Tu és.

Aqui renovo minha fé em Tua presença e desejo profundamente ser sal e luz da Terra no e com o mundo. Em nome do Verbo que agiu na boca dos profetas, na vida dos apóstolos e que age na aldeia global... AMÉM!

Abraço sócio-teológico, Rev. Cláudio Márcio




quarta-feira, 20 de julho de 2011

Revolução sexual: da reprodução ao prazer.






“A sexualidade plástica é a sexualidade descentralizada, liberta das necessidades de reprodução.” (Anthony Giddens)


Por: Cláudio Márcio


O tema da sexualidade tem sido muito estudado e debatido em nossa contemporaneidade em diversos espaços da sociedade civil, escolas, ONGs e outros... No entanto, é evidente que as transformações sociais a respeito deste tema se dão em contextos específicos e por interesses diversificados onde o corpo (sobretudo o feminino) ocupa um lugar central neste processo que vai além da percepção de reprodução e se permite outras experiências e sensações historicamente negadas. Isto porque a mulher, nas sociedades patriarcais, encontrava-se sujeita aos mandos e desmandos do controle masculino, da ordem social, das leis do Estado e da Igreja, que comungavam do mesmo objetivo: o adestramento da sexualidade feminina, a repressão das filhas de Eva, que simbolizavam (caso as correntes fossem retiradas) ameaça ao equilíbrio doméstico, enfim, à ordem moral.


Nesse contexto, e em meio a esse adestramento, a sexualidade era o foco que trazia maior preocupação social. Vale ressaltar que em todas as culturas, a iniciação sexual é uma etapa marcante para a construção social do masculino e do feminino, ou seja, homens e mulheres são ensinados a olhar para a sexualidade de forma diferente. Nesse sentido, “a sexualidade é mais que a mera relação carnal, porque envolve a mobilização de formas sociológicas e culturais”. (PINHO e SANSONE, 2008, p.259)


Porém, é necessário convidar algumas pessoas para sentar-se à mesa e continuar este diálogo e ou debate sobre a dinâmica da sexualidade no processo histórico e social. Logo, como afirmou Peter Berger a realidade é construída socialmente entre outros elementos, a partir da linguagem e ou discurso em um jogo de disputas simbólicas e ideológicas na arena cultural. Daí é necessário perceber e identificar neste processo de construção social, quem fala? De onde fala? Para quem fala? A serviço de quem é a fala? Logo, os agentes são histórico-sociais, que elaboram discursos e representações a partir do seu contexto social


Contudo, é necessário entender que as mudanças de comportamento sexual não se deram de uma noite para o dia, essa metamorfose se dá muitas vezes lentamente e envolve questões múltiplas. Uma vez que como sinalizou Max Weber, estamos presos a teias e ou esferas que criamos na sociedade onde estamos inseridos. Desta maneira, o humano exerce diversos papéis sociais para responder de forma adequada o que cada contexto exige dele. Isto é, como afirmou Anthony Giddens: “Não são apenas os indivíduos que estão posicionados em relação uns aos outros; os contextos de interação social também estão.” (GIDDENS, 1991, p. XXVII)


Essa transformação assinala então, um rompimento com o paradigma religioso que durante muito tempo dominou a conduta moral da sociedade européia. Ou seja, o sacerdote religioso utilizava-se da sua eficácia simbólica como representante de Deus, onde não poderia ser questionado e por isso deveria cuidar da família e dos valores cristãos para que houvesse harmonia social. Ora, é evidente que o processo da sexualidade ocorre em espaços de conflitos, luta poder, violência. Daí, como afirmou Michel Bozon “Os significados mobilizados em cada sociedade para evocar as relações sexuais servem, igualmente, para se referir à dominação de sexo em geral, ou até mesmo a dominação de classe”. (BONZON, 2004, p.22)


Entretanto, Bozon sinaliza que o processo da reprodução era androcêntrica, o que provocava subordinação feminina e inferioridade desta no mundo social. No entanto, houve rupturas na ordem social que geraram transformações sociais, políticas e intelectuais e outras, que passam evidentemente pelas relações entre os sexos. Daí, a noção de amor conjugal que é construído, há a busca do autocontrole (regular conduta). Logo, é importante recordar que a noção de espaço íntimo é historicamente recente, uma vez que no período medieval havia vários leitos onde pais, filhos e empregados não estavam sistematicamente separados.


Todavia, a proibição de atos sexuais nos espaços públicos (punição pela lei) começa a instaurar-se nas sociedades ocidentais, não se podia mais falar livremente sobre sexo nas conversas cotidianas entre pais e filhos. Logo, ficava estabelecido o que se podia realizar no público e nos bastidores, como bem apontou Norbert Elias: “formação progressiva de duas esferas diferentes da vida humana, uma íntima e secreta, e outra aberta, um comportamento clandestino e um comportamento público”. (BOZON, 2004, p.35 apud ELIAS, 1973, P. 317)


Ora, todas as sociedades passam por um período de forte fecundidade e forte natalidade. Segundo Bozon, um elemento significativo neste processo de transformação da sexualidade foi a revolução contraceptiva onde em 1960, nos países desenvolvidos, formas de contraceptivas mais confiáveis gera aumento da autonomia social feminina. Ou seja, há autonomização da sexualidade com respeito à procriação, um exemplo disso foi a difusão maciça do DIU. Na sexualidade contemporânea, a procriação ocupa apenas um espaço reduzido e marginal. Isto é, ocorre uma revolução sexual que coloca na mulher o poder da reprodução (o poder muda de mãos, ou melhor dizendo, retorna às mãos pensando nos mitos fundantes), e há uma reviravolta na maneira de encarar a fecundidade, sobretudo com a inseminação artificial, em que a fecundação in vitro (encontro entre os óvulos e espermatozóides) é feito em laboratório mediante o controle médico.


essa reprodução sem relações sexuais assume um papel simbólico importante e traduz muito bem a evolução contemporânea que aproximou a procriação da técnica, afastando-a da “natureza” e da sexualidade, com o desejo de ter filhos não mais inscrito, necessariamente, no calor do desejo sexual. (BONZON, 2004, p.45)




Nesse sentido, ocorre também um enfraquecimento na instituição casamento. Contudo, o fato de não viver com alguém não impede, sobretudo com a revolução sexual, a existência de uma vida sexual, tanto para homens como para mulheres. Daí, a sexualidade, que era praticada pelo indivíduo casado, tornou-se uma experiência interpessoal indispensável à existência do casal. Ora, a relação sexual no relacionamento tornou-se termômetro para medir a temperatura do casal, podendo até gerar um problema conjugal, levando muitas vezes a separação. Isto é, se busca em nossos dias reciprocidade em relação à prática sexual (o direito ao prazer).


Desta forma, é importante perceber que as mudanças não ocorrem aleatoriamente e pacificamente, no momento de transição entre o que permanece e o que se deixa de lado, há luta de interesses, de dominação por um lado e há também resistência do outro. Resistência e recriação de suas relações sociais no cotidiano. Ou seja, as feministas buscavam a efetivação de suas demandas, sobretudo, em relação ao direito de dispor do próprio corpo, de suas capacidades reprodutivas e a resistência contra violência sexual.


Todavia, para Anthony Gidenns, o tema da sexualidade desloca-se do setor privado para o público, onde em muitas reflexões sobre a sexualidade (feita por homens), não há menção ao amor; e o gênero aparece marginalizado na discussão. Logo, sinaliza o autor:


A sexualidade plástica pode ser caracterizada como um traço da personalidade e, desse modo, está intrinsecamente vinculada ao eu. Ao mesmo tempo, em princípio, liberta a sexualidade da regra do falo, da importância jactanciosa da experiência sexual masculina.”( GIDDENS, 1993, p.10)



Nesse caso, há uma descentralização do masculino para efetivação do prazer sexual, uma vez que, o corpo feminino se permite através de outras possibilidades com o outro e consigo mesma, a dimensão do prazer sexual.


No entanto, apesar de inúmeros avanços e ou conquistas em uma sexualidade mais democrática, há uma moral sexual diferenciada nos hábitos social de homens e mulheres. Isto é, as mulheres não admitem mais a dominação sexual masculina, e ambos os sexos devem lidar com as conseqüências deste fato. Uma vez que: “As mulheres esperam tanto receber quanto proporcionar prazer sexual, e muitas começaram a considerar uma vida sexual compensadora como um requisito chave para um casamento satisfatório”. (GIDDENS, 1993, p.21-22)


Ora, pensar o humano e seu relacionamento com o outro, pensar na dimensão do corpo e do poder, é convidar Foucault na sua percepção do “poder disciplinar” característico da prisão e do asilo. Ou seja, o poder disciplinar produzia corpos dóceis controlados em suas atividades e não atuando espontaneamente sobre os impulsos e desejos. Porém, o poder se manifesta aqui como uma força de repressão. Daí, Segundo Foucault: “O sexo tornou-se de fato o ponto principal de um confessionário moderno... o confessionário católico foi sempre um meio de controle da vida sexual dos fiéis”. (GIDDENS, 1993, p. 29) No entanto, Giddens faz criticas a Foucault no que diz respeito ao tema da sexualidade em suas dimensões do poder, do discurso, do corpo... (o que foi uma contribuição significativa) Mas, silenciou-se quanto às vinculações da sexualidade com o amor romântico (que ilumina a vida e traz alegria ao coração), elemento fortemente vinculado às mudanças na família.


Durante o século XIX, a formação dos laços matrimoniais, para a maior parte da sociedade européia, ultrapassava os valores econômicos e os limites dos laços de parentesco, através da ideia do amor romântico. Nesse contexto, o lar passou a ser um ambiente distinto, separado do trabalho; métodos modernos de contracepção foram criados, planejamento familiar... Ou seja, “a sexualidade passou a fazer parte de uma progressiva diferenciação entre o sexo e as exigências da reprodução... A reprodução pode ocorrer na ausência da atividade sexual”. (GIDDENS, 1993, p.37)


Entretanto, cabe ressaltar que a ideia do amor romântico está intimamente relacionado com os valores morais da cristandade, a fazer do outro alguém especial. Por esse e outros motivos que a autonomia sexual feminina e o florescimento da homossexualidade têm gerado tantos conflitos na sociedade. O que está em jogo é uma luta política por direitos negados a quem, insistentemente, afirma sua identidade sexual nesta arena cultural.


Desta maneira, estamos diante de uma nova fase da sociedade em que as mudanças ocorrem com maior velocidade devido ao avanço tecnológico, mudança nos meios de comunicação, sobretudo com o advento do computador e a internet onde a comunicação se estabelece com maior eficácia e o mundo se une através deste poderoso instrumento de comunicação. Outro aspecto significativo foi a descentralização do poder religioso na vida das pessoas. Ou seja, não só cresce o número de religiosos deste ou daquele grupo, cresce também o número de pessoas sem religião alguma.


Ora, os agentes sociais se colocaram não somente como participantes de vivências na sociedade, mas, construtores de suas relações e de novas demandas que se estabelecem no cotidiano. Assim, o corpo, o poder, a sexualidade, a pluralidade ganha espaço na agenda política do governo e ou grupos civis em que as identidades estão sendo construídas através do discurso, da militância, da reflexão acadêmica... Isto é, os espaços estão sendo ocupados e uma nova ordem social - no que diz respeito ao tema da sexualidade - tem se instaurado.


Evidentemente, que esse processo de mudança é conflituoso e que a tradição e o novo medem força na maioria das vezes, não para se complementarem e reverem suas ações, mas para anularem o outro na busca do poder, da dominação e dos interesses que estão em ambos os espaços. Logo, de um lado o mercado sexual, o mercado da prostituição, de objetos e imagens... E do o outro, a moral cristã, a preservação da família que insiste em não se rever diante de um novo tempo.


Contudo, somente através de uma revolução sexual poderia ocorrer a mudança de uma prática sexual que antes se limitava tão somente a reprodução (diga-se de passagem, para a vida das mulheres), mas, que agora perpassa na dimensão do prazer. Ou seja, há um novo olhar do humano para si mesmo e para o outro. Há uma emancipação humana que tem gerado novas relações sociais no que diz respeito à sexualidade. Como lhe dar com esse fenômeno? Aonde iremos chegar com a liberdade sexual total? Sinceramente, não sei... Sei que a mesa está posta e que tradição e novo, fé e ciência precisam dialogar e que a experiência da reprodução pode ser também extremamente prazerosa.




REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


BOZON, Michel, Sociologia da Sexualidade: Tradução Maria de Lourdes Menezes. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2004.


BRETON, David Le. A Sociologia do Corpo. 4° edição. Rio de Janeiro: Vozes, 2010.


DEL PRIORE, Mary (Org.). História das mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto, 1997.


GIDDENS, Anthony. A transformação da intimidade: amor & erotismo nas sociedades modernas. São Paulo: Editora UNESP, 1993


_________. As Consequências da Modernidade: tradução Raul Fiker. São Paulo: Editora UNESP, 1991.


PINHO, Osmundo & SANSONE, Livio (Orgs.). Raça: novas perspectivas antropológicas. 2 ed. Salvador: ABA, EDUFBA, 2008.

domingo, 3 de julho de 2011

Valeu Lacombe!

Hoje (03/07/11) faz exatamente uma semana em que a comunidade do CAHL (Centro de Artes, Humanidades e Letras) da UFRB (Universidade Federal do Recôncavo da Bahia) sente a perda significativa do Professor Dr. Marcelo Lacombe (um sociólogo brilhante que sem dúvida alguma marcou a vida de todos nós do corpo de CISO da UFRB). Nas palavras do Professor Dr. Diogo Valença: “um cientista social completo”.


Percebe-se em todos os cantos da UFRB como esta semana tem sido muito difícil para o nosso colegiado, professores e alunos de CISO... Em cada semblante a dor, a tristeza, a busca de alívio para tentar reestruturar o próprio ser diante da vida. Mas, o que é a vida? Gonzaguinha aponta em uma de suas canções: “E a vida! E a vida o que é? Diga lá, meu irmão. Ela é a batida de um coração? Ela é uma doce ilusão Hê! Hô!... E a vida! Ela é maravilha, ou é sofrimento? Ela é alegria ,ou lamento? O que é? O que é? Meu irmão... Há quem fale que a vida da gente é um nada no mundo. É uma gota, é um tempo que nem dá um segundo... Há quem fale que é um divino mistério profundo. É o sopro do criador numa atitude repleta de amor...

Penso que quando perdemos alguém de uma forma tão trágica como esta, inúmeras perguntas vêm em nossa cabeça: por que isso aconteceu? Qual o sentido da vida? Era o dia deles morrerem? Houve imprudência? A vida foi justa? A essas e outras perguntas, eu como cientista social (em formação) e Reverendo da IPU (Igreja Presbiteriana Unida) poderia arriscar algumas palavras... Mas, o que dizer diante deste evento? Penso ser mais honesto o silêncio e ou tentar dizer algo através de uma reflexão como esta que só hoje consigo fazer.

Assim sendo, sei que perdemos um grande referencial, outros um amigo, um colega, um filho, um irmão, um primo... Sobretudo perdemos uma vida! Qual é o preço de uma vida? Essa é a pergunta que me vem à cabeça. Por quê? Porque há um sistema político-econômico opressor que insiste em nos tratar como objetos, como número na economia global e às vezes nos pegamos correndo tanto de um lado para o outro e esquecemos quão precioso é o caminho e as pessoas que estão a nossa volta caminhando conosco.

Desta maneira, encerro minha reflexão com duas cenas que me vem à memória:

1 – Eu e Paulo Roberto conversando na porta da UFRB- CAHL, nos encontramos com um homem negro, cheio de dreads, muitas vezes encontra-se bêbado e ou lombrado... para muitos um louco (muitos estudantes e professores o conhecem ), e nos perguntou: Tá estudando? Estudem mais! Fato é que quando nós falamos para ele que Lacombe tinha falecido o cara parou, os olhos encheram de lágrimas e disse: “deixa de brincadeira, gordo... Lacombe morreu?”. Após um pequeno tempo ele saiu de perto da gente e disse: “vou fazer uma homenagem a ele!”.

2 – No dia seguinte, este mesmo homem faz uma coroa de flores e leva para a UFRB-CAHL e coloca na grade próxima à escada do setor administrativo e dizia: “Lacombe está mais aqui do que nunca!”

Diante disso, peço a Deus (Pai e Mãe) de toda criação que nos ajude nesse momento tão doloroso que estamos vivendo. Que haja força em nossos braços, mãos e pés para continuarmos na batalha nossa de cada dia. Que o nosso coração encontre paz, esperança, consolo. Que o sopro do Espírito refaça nossa existência, que os braços do Deus do amor nos envolvam com muito carinho e que muito em breve possamos voltar a sorrir. AMÉM!

Abraço sócio-teológico aos familiares de Lacombe e a comunidade da UFRB-CAHL /Rev. Cláudio Márcio