Texto do pastor Marcos Monteiro.
Meu encantamento com a IPU vem
dos anos setenta e oitenta, quando me encontro como cristão e aprendiz da
ideia de Reino de Deus. Antes disso já havia tido um ligeiro contato com o
Rev. João Dias de Araújo, assistindo a uma palestra sua em um seminário
batista sobre um Cristo na literatura de cordel que ficou sempre na minha
memória. Contatos posteriores com ex-alunos seus e um encontro pessoal em que
me presenteou com o seu livro “Inquisição sem fogueiras” fizeram-me aumentar
o respeito e outro momento posterior no ITEBA transformaram respeito em
admiração.
O próprio ITEBA fundado em
torno de nomes relevantes como Áureo Bispo e Djalma Torres, pastor batista,
era um referencial teológico inimaginável para quem procurava catar na
formação teológica sinais de esperança e reflexões e compromissos corajosos.
Um seminário que aglutinava teólogas feministas e abria a porta do diálogo
inter-religioso se colocava claramente na contramão do projeto protestante de
crescimento numérico associado a uma postura conservadora.
A ditadura militar era sem
dúvida a oportunidade comum de uma contraofensiva da fé pensada e desafiada a
atitudes concretas. O desafio do ecumenismo e da formação de uma consciência
social e política para lideranças e setores do trabalho urbano e rural estava
assim assumida por essa jovem instituição presbiteriana olhada com suspeita
pelas velhas congêneres. A distância era muito grande. Enquanto o Rev.
Edijéce Martins era visto como revolucionário pelo sínodo nacional por
ordenar à revelia diaconisas em sua igreja na Torre Madalena na cidade do
Recife, a IPU já se firmara como uma organização eclesial com espaço para
pastoras.
Gosto sempre de lembrar da
historinha que o próprio Rev. João Dias divulgava. Trabalhando com Francisco
Julião na formação educacional das ligas camponesas levava textos bíblicos
dos profetas para mostrar a cristãos, evangélicos e católicos, a força da
denúncia da injustiça social na Bíblia. A inteligência nacional começou então
a inquirir e a investigar sobre a presença e participação de agitadores entre
os agricultores de Pernambuco. Os nomes dos agitadores seriam um tal de Amós,
um tal de Oséias, um tal de Jeremias, um tal de Isaías e o principal deles, o
líder, um tal de João Dias.
Essa atitude do reverendo e da
Igreja não foi tomada facilmente e os preços a pagar foram muitos. Mas essa
herança permanece como desafio para as novas gerações e para os futuros
participantes dessa comunidade que encheu a história se enchendo de
histórias. A minha pergunta sobre essa IPU agora e sobre a sua juventude
agora tem algumas respostas mais muito mais perguntas.
Participei de um encontro em
Belo Horizonte, lá pelos idos de 2006, em que a juventude mostrava sinais de
retomada do ecumenismo e também sinais de que o mundo havia mudado. Um
momento muito belo da Ceia do Senhor foi quando entoamos todos juntos o
cântico “Cio da terra” demonstrando continuidade entre teologia, liturgia e
cultura, apontando para um tipo de espiritualidade engajada e celebrante. Ao
mesmo tempo, percebia nas entrelinhas dos bastidores preocupações com os
caminhos atuais da igreja diante dessa avassaladora cultura protestante
evangélica, pentecostal e conservadora dominante.
Mais recentemente participei de
outro encontro em que o tema família era o referencial principal da
discussão. Trouxe em minha palestra exemplos de famílias diversas das
normativas, como filhos de pais homossexuais, ou vivências já antigas de
pessoas do mesmo sexo. Fiquei um pouco surpreso de não encontrar definições
claras dos líderes da igreja quanto a essas questões. Desse modo, se não dá
para negar a beleza da herança histórica da IPU e da coragem de setores da
igreja se aproximarem das pautas mais atuais da sociedade contemporânea, precisamos
lançar a pergunta sobre o futuro da IPU.
A tendência das instituições
mais revolucionárias se cristalizarem como baluartes do conservadorismo é
lição da história encontrada em todos os lugares. Uma teologia revolucionária
e provocadora é substituída sistematicamente por uma reflexão de trincheira,
de defesa de pilares e fundamentos que não são tão claros e importantes
assim.
São várias as pautas trazidas
pela existência em sua totalidade como por exemplo a questão da violência.
Entretanto, anterior a tudo isso, o preconceito e a discriminação enquanto
solos de agressões gratuitas e guerras declaradas parecem necessitar de uma
resposta urgente. Uma agenda mais positiva sobre a sexualidade humana e uma
celebração da alteridade que inclui a homossexualidade e os adeptos de
religiões de origem africana são assuntos do momento.
Uma luta mais visível pela
fraternidade inter-religiosa e a ordenação de pastores e pastoras
homossexuais, por exemplo, já ocorrem em muitos lugares do mundo e do Brasil.
Seria muito lógico para a nossa análise de pastor batista encantado com a IPU
aguardar a corajosa resposta dessa igreja capaz de lutar contra preconceitos
e discriminações causadores de sofrimentos e violências evitáveis. Na nossa
opinião, o futuro da IPU, enquanto uma das poucas igrejas relevantes da
história do Brasil, será decidido a partir de suas decisões nesses dois
campos.
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segunda-feira, 16 de novembro de 2015
A IPU ONTEM, HOJE E AMANHÃ: visão de um batista ecumênico.
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