segunda-feira, 16 de novembro de 2015

A IPU ONTEM, HOJE E AMANHÃ: visão de um batista ecumênico.


Texto do pastor Marcos Monteiro.

Meu encantamento com a IPU vem dos anos setenta e oitenta, quando me encontro como cristão e aprendiz da ideia de Reino de Deus. Antes disso já havia tido um ligeiro contato com o Rev. João Dias de Araújo, assistindo a uma palestra sua em um seminário batista sobre um Cristo na literatura de cordel que ficou sempre na minha memória. Contatos posteriores com ex-alunos seus e um encontro pessoal em que me presenteou com o seu livro “Inquisição sem fogueiras” fizeram-me aumentar o respeito e outro momento posterior no ITEBA transformaram respeito em admiração.

O próprio ITEBA fundado em torno de nomes relevantes como Áureo Bispo e Djalma Torres, pastor batista, era um referencial teológico inimaginável para quem procurava catar na formação teológica sinais de esperança e reflexões e compromissos corajosos. Um seminário que aglutinava teólogas feministas e abria a porta do diálogo inter-religioso se colocava claramente na contramão do projeto protestante de crescimento numérico associado a uma postura conservadora.

A ditadura militar era sem dúvida a oportunidade comum de uma contraofensiva da fé pensada e desafiada a atitudes concretas. O desafio do ecumenismo e da formação de uma consciência social e política para lideranças e setores do trabalho urbano e rural estava assim assumida por essa jovem instituição presbiteriana olhada com suspeita pelas velhas congêneres. A distância era muito grande. Enquanto o Rev. Edijéce Martins era visto como revolucionário pelo sínodo nacional por ordenar à revelia diaconisas em sua igreja na Torre Madalena na cidade do Recife, a IPU já se firmara como uma organização eclesial com espaço para pastoras.

Gosto sempre de lembrar da historinha que o próprio Rev. João Dias divulgava. Trabalhando com Francisco Julião na formação educacional das ligas camponesas levava textos bíblicos dos profetas para mostrar a cristãos, evangélicos e católicos, a força da denúncia da injustiça social na Bíblia. A inteligência nacional começou então a inquirir e a investigar sobre a presença e participação de agitadores entre os agricultores de Pernambuco. Os nomes dos agitadores seriam um tal de Amós, um tal de Oséias, um tal de Jeremias, um tal de Isaías e o principal deles, o líder, um tal de João Dias.

Essa atitude do reverendo e da Igreja não foi tomada facilmente e os preços a pagar foram muitos. Mas essa herança permanece como desafio para as novas gerações e para os futuros participantes dessa comunidade que encheu a história se enchendo de histórias. A minha pergunta sobre essa IPU agora e sobre a sua juventude agora tem algumas respostas mais muito mais perguntas.

Participei de um encontro em Belo Horizonte, lá pelos idos de 2006, em que a juventude mostrava sinais de retomada do ecumenismo e também sinais de que o mundo havia mudado. Um momento muito belo da Ceia do Senhor foi quando entoamos todos juntos o cântico “Cio da terra” demonstrando continuidade entre teologia, liturgia e cultura, apontando para um tipo de espiritualidade engajada e celebrante. Ao mesmo tempo, percebia nas entrelinhas dos bastidores preocupações com os caminhos atuais da igreja diante dessa avassaladora cultura protestante evangélica, pentecostal e conservadora dominante.

Mais recentemente participei de outro encontro em que o tema família era o referencial principal da discussão. Trouxe em minha palestra exemplos de famílias diversas das normativas, como filhos de pais homossexuais, ou vivências já antigas de pessoas do mesmo sexo. Fiquei um pouco surpreso de não encontrar definições claras dos líderes da igreja quanto a essas questões. Desse modo, se não dá para negar a beleza da herança histórica da IPU e da coragem de setores da igreja se aproximarem das pautas mais atuais da sociedade contemporânea, precisamos lançar a pergunta sobre o futuro da IPU.

A tendência das instituições mais revolucionárias se cristalizarem como baluartes do conservadorismo é lição da história encontrada em todos os lugares. Uma teologia revolucionária e provocadora é substituída sistematicamente por uma reflexão de trincheira, de defesa de pilares e fundamentos que não são tão claros e importantes assim.

São várias as pautas trazidas pela existência em sua totalidade como por exemplo a questão da violência. Entretanto, anterior a tudo isso, o preconceito e a discriminação enquanto solos de agressões gratuitas e guerras declaradas parecem necessitar de uma resposta urgente. Uma agenda mais positiva sobre a sexualidade humana e uma celebração da alteridade que inclui a homossexualidade e os adeptos de religiões de origem africana são assuntos do momento.

Uma luta mais visível pela fraternidade inter-religiosa e a ordenação de pastores e pastoras homossexuais, por exemplo, já ocorrem em muitos lugares do mundo e do Brasil. Seria muito lógico para a nossa análise de pastor batista encantado com a IPU aguardar a corajosa resposta dessa igreja capaz de lutar contra preconceitos e discriminações causadores de sofrimentos e violências evitáveis. Na nossa opinião, o futuro da IPU, enquanto uma das poucas igrejas relevantes da história do Brasil, será decidido a partir de suas decisões nesses dois campos.

Maceió, 16 de novembro de 2015.

http://madoniram.blogspot.com.br/