“Ser cristão é, com efeito, aceitar e viver solidariamente a fé, a esperança e a caridade, no sentido que a palavra do Senhor e o encontro com ele dão ao devir histórico da humanidade a caminho da comunhão total”. (Gustavo Gutierrez)
A cada manhã me vejo não pertencente mais a uma maneira de viver a experiência religiosa de forma homogênea e a meu ver, extremamente “líquida”. Isto é, seu efeito acaba logo. Desta maneira, como estudante de Ciências Sociais e concordando com Peter Berger quando aponta que “o sociólogo é o homem que tem que ouvir mexericos, menos a contragosto, o homem que sente tentação em olhar através de buracos de fechadura, ler correspondência alheia, abrir armários fechados” (BERGER, 2010, p.28), me lanço a refletir e perceber através de experiências aparentemente simples o que está oculto a ser desvendado. Ou seja, “o sociólogo tenta ver o que existe”. (BERGER, 2010, p.14)
Evidente que como não há neutralidade nas ciências sociais, o sociólogo tem um objeto a conhecer (o mundo social), de que ele próprio é produto. Assim, como pode efetuar uma dúvida radical, se ele é um ser social? Mas Bourdieu sinaliza, “como pode o sociólogo escapar à persuasão clandestina que a cada momento sobre ele se exerce, quando lê o jornal, ou quando vê televisão, ou mesmo quando lê os trabalhos dos seus colegas?” (BOURDIEU, 2010, p.36) Desta maneira, a ruptura é uma conversão do olhar... um novo olhar (um olhar sociológico).
De fato, a sociologia tem como objetivo precípuo compreender e explicar as permanências e as transformações que ocorrem nas sociedades humanas e até indicar algumas pistas sobre os rumos das mudanças Assim levanto minha cabeça e vejo: a mercantilização da fé, o jugo pesado da religião, a demonização do outro, o não diálogo, a manutenção de estruturas de dominação em nome do Sagrado... Confesso: tudo isso me dá nojo! Se ser cristão é isso, então não quero mais ser cristão.
Contudo, sei que existem outras experiências de vivência da fé de uma maneira mais humana e libertadora espalhada neste solo brasileiro, em comunidades presbiterianas, batistas e outras que meu coração enche-se de alegria e esperança. Ter encontrado no caminho pessoas como: João Dias de Araújo (IPU), Israel Argôlo, Marcos Monteiro, Jorge Nery, Jardson Gregório, Paulo Nascimento e Wellington (IBP), Adriano Trajano, Carlos Queiroz, Enilson, Wagner Borges, Joel (Batista Nazaré) e tantos outros, me faz perceber que sempre existem brechas para se pensar e agir diferentemente do que prega-se o neoliberalismo.
Que cara machista não é? E as mulheres? Bem, poderia apontar: Icléa Rebouças, Valdelice Silva, Jussiana Silva, Tatiana Rebouças, Jemima Evangelista, Sônia Mota, Odja (IBP), Anita Wright e outras. Olha só, são homens e mulheres com quem tive contato e sei que existem tantos Josés e Marias que ainda não conheci. Sei que esses nomes me mostram que há outra maneira de viver a fé e de celebrar a vida. Logo, quando levanto a cabeça e olho, vejo um fardo leve e suave, vejo misericórdia e perdão, vejo cuidado e emancipação.
Acredito e vejo que o Espírito tem soprado aqui e ali e que este sopro ultrapassa a comunidade eclesiástica e promove caos-ordem nas esquinas e praças da cidade e ou em outros territórios onde há humanos. Diante disso, acredito que é chegado um momento de amadurecimento da fé como aponta o apóstolo Paulo: “Quando eu era menino, falava como menino, sentia como menino, discorria como menino, mas, logo que cheguei a ser homem, acabei com as coisas de menino” (1 Cor13:11 ). Ou seja, assumirmos nossa responsabilidade como humanos e, independente da maneira que se vive a fé (neste ou naquele grupo), penso que necessitamos de outras práticas que ultrapassem a nossa imagem no espelho.
Assim, para os que crêem, é chegado o Reino de Deus onde tod@s devem arrepender-se. De quê? Bem, poderia sinalizar alguns pontos como: arrepender-se de uma religiosidade mesquinha que não traduz e ou revela o que Cristo nos propõe a ser; arrepender-se da arrogância; do preconceito; da ganância; da incredulidade (se não em Deus, em nós mesmos e nos outros); da omissão diante de tanta injustiça...Onde está nossa dimensão profética?
Desta maneira, os desafios de um novo tempo estão exigindo de nós possíveis respostas. Mas, o que falamos? As vezes tenho a impressão que falamos, falamos, e não dizemos nada. Ou seja, não acompanhamos as transformações sociais e queremos ser igreja como os nossos ancestrais. Bem, neste jogo sempre devemos nos perguntar, o que permanece? O que deve se modificar? Por quê? Ora, penso que é necessário e saudável rever algumas questões, não? Minhas inquietações, decepções e encantos são muitos. Mas, continuo em Tuas mãos, continuo sendo Teu, continuo crendo em Ti...Só sei que Teu rosto e Tua voz são cada vez menos institucionais-burocrático e, cada vez mais simples e cheios de levesa (como pássaro em minha janela a cantar).
Abraço sócio-teológico
Cláudio Márcio
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