A Assessoria de Assuntos Teológicos, que tem como assessor o Rev. Claudio Marcio Rebouças, da IPU de Muritiba/BA, propõe para nós, membros da IPU, que escrevamos um pouco sobre aquilo que nos encanta e desencanta em nossa denominação, em uma forma de nos conhecermos e de promover uma reflexão teológica.
Este trabalho tem como base o texto de Mateus 16:13b que diz: "Quem dizem os homens ser o Filho do homem?"
Quem quiser participar, poderá enviar um texto, de até duas páginas,identificando-se, para nosso assessor (revcacau@hotmail.com) que irá, posteriormente, disponibilizar sua opinião neste espaço.
Participe!
Um dos participantes foi Victor Aurélio, segue o seu texto.
Por, Victor Aurélio Santana Nascimento.[1]
Os quadros de opressão, outrora aquecidos pelo furor imperialista do
século XIV, tiveram suas bordas ampliadas à custa de muita degradação dos povos
da América Latina. Se, por um lado, nos é possível arriscar o quanto de ouro,
prata e demais riquezas foram expropriadas dessas terras, por outro, estamos
longe de conhecer significativamente as dores sofridas pelos povos nesse
território, em sustento das regalias das classes mais abastardas da Europa.
É consenso que o discurso cristão, engendrado por muito tempo por um
clero burguês, contribuiu (ainda contribui?) fortemente para a construção desse
quadro de opressão, servindo como aparelho de mistificação a serviço das
classes economicamente dominantes. No entanto, lembrando o surgimento das
comunidades primitivas cristãs, e me servindo da leitura dialética da
realidade, a continuidade das mazelas sociais favoreceu o surgimento de
contra-pontos no seio da cristandade e de uma abertura para o retorno aos
fundamentos cristãos desgastados pelas conveniências burocráticas,
institucionais e classistas. Do que estamos falando, afinal de contas?
Cresce na América Latina, de modo mais organizado e a partir do primeiro
quadrante do século XX, aquilo que me parece semelhante ao ocorrido nas lutas
judaicas contra a violência de grandes centros da época como, o Egito e a
Babilônia: começa-se a criar, a partir de um contexto de marginalização e de
sangria social, um grau organizativo das populações mais sofridas, numa
articulação entre o que se tem de sofrimento concreto e a fé trajada na imagem
de uma divindade capaz de libertar não só a alma, mas o corpo da fome, do
desemprego, da inacessibilidade aos espaços de cultura, processos de saúde,
lazer e demais dimensões que compõe o conjunto de condições básicas para uma
vida digna. O que a Igreja Presbiteriana Unida do Brasil (IPU) tem a ver com
isso?
Sou grato por muito do que vivi e experienciei no meu trajeto pela
igreja Batista. Através da igreja pude conhecer comunidades alheias a toda
sorte de cuidados governamentais, e, junto a isso, compreender que o amor
cristão deve ser mais do que algo que se sente só, entre paredes e liturgias religiosas.
Antes, deve constituir-se como um esforço prático capaz de operar mudanças
efetivas e estruturais no laço social. Esse entendimento favoreceu a minha
escolha por ocupar frentes de luta que me punham em posição de militar por
processos emancipatórios e de libertação das classes mais oprimidas. Nesse
percurso, conheci a IPU, na pessoa do amigo e Reverendo Cláudio Rebouças, e,
posteriormente, numa das reuniões com a comunidade.
O primeiro espanto que me ocorreu – e olhem que eu já vi muita coisa em
minha vida –, foi ouvir e ver ser bem recepcionada numa das reuniões da IPU,
uma pregação que falava sobre a urgência de discutirmos sobre machismo,
racismo, gênero e participação popular na construção de uma sociedade mais
justa e menos desigual, dentro da igreja. Aquilo foi um arrebatamento de
sentidos, porque eu nunca tinha encontrado na igreja cristã um norte tão
voltado para a ruptura de dogmas e práticas disciplinares que, em verdade, só
contribuem para a manutenção de uma organização social injusta e verticalizada.
Naquele momento, a IPU passou a figurar para mim – diferente do ópio com o qual
Karl Marx, em 1844, comparou a crença religiosa – como um dos instrumentos
estratégicos capazes de contribuir para a emancipação – da mulher, do negro,
daqueles que fazem uso dos diferentes modos de experenciação da sexualidade e
demais agrupamentos –, pela via da construção de uma consciência histórica e
crítica sobre a vida, e, inevitavelmente, sobre a vida na América Latina.
Estamos distantes do muito que desejamos enquanto minorias sociais e
ainda é possível nos depararmos com muitos resquícios de violências aqui
empregadas a partir do século XV. Porém, as inquietações estimuladas em
círculos como os da IPU contribuem claramente para que esse quadro social ganhe
novos rumos, nortes libertários. Não seria um erro, portanto, crer ser a IPU,
situada na cidade de Muritiba, uma importante ferramenta de transformação nos
níveis individual e social, muito menos assumir que a sua presença no diverso
conjunto cristão é um germe revolucionário.
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