sexta-feira, 10 de abril de 2020

Sexta feira da paixão à compaixão: “Se possível afasta este cálice”


          O calvário de Jesus nos acena à obediência ao Pai, mas também a sua escolha definitiva: a morte de cruz. A paixão de Jesus é a culminância da sua união e da realização da missão que o pai lhe delegou. A cruz, sinal de morte até então, assume nova simbologia, a partir desta caminhada “estranha” feita por Jesus, reforçando o que o próprio Jesus havia dito: “se o grão de trigo não cair na terra e não morrer, permanecerá ele só, mas se morrer produzirá muito fruto” (Jo 12,24), como uma forma de leitura do que viria lhe acontecer.
           A sua paixão foi um ato de liberdade. Não foi coagido a assumir, mas sua força espiritual e moral levou a isso.  Vemos, assim, que Ele vive e determina a própria dialética da sua existência, ao mencionar em Jo 10,18 “a minha vida ninguém a tira de mim; pelo contrário, eu espontaneamente a dou”. A paixão de Cristo é expressão dessa afirmação de que ele dá livremente a sua vida, de acordo com as circunstâncias  em que passou a viver após a aceitação  da sua missão.

A paixão de Jesus foi consequência das suas ações. Não teria havido sexta feira da paixão se Jesus não fosse movido pela compaixão. A compaixão em Jesus nascia do encontro, do contato que tinha com os mais necessitados, e sobretudo, por ter assumido para si a vida dessas pessoas em todas as suas dimensões: na alimentação, ao perceber que aquela multidão está abandonada, ignorada na sua necessidade básica e “compadeceu-se deles porque eram como ovelha que não tem pastor” (Mc 6,34) e diz aos discípulos que “deem eles mesmos de comer” (Mc 6,37);  na discriminação  de gênero ao perguntar:  “mulher, ninguém te condenou” (Jo 8,10) ; na saúde, “pegue seu leito e vai”  (Jo 5,8); no acúmulo de bens, “vai, vende tudo o que possui e dá aos pobres” (Mt 19,21);  nos problemas emocionais, psíquicos e espirituais mandando ao Geraseno  que volte para casa e conte aos seus tudo o que lhe tinha feito” (Lc 8,39) . Esses e outros exemplos sintetizam o que Jesus veio trazer ao mundo e também geram a perseguição dos seus opositores.
A atividade essencial de Jesus era o cuidado, algo deixado de lado no seu tempo. Assim, Ele demonstra palpavelmente seu modo de ser, chamando todos para si: “Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração”. (Mt 11,28-29).
 Este é um pouco o pano de fundo da paixão de Jesus.  Essa via dolorosa e de sofrimento enfrentada por Jesus não aconteceu somente na sexta feira. As estruturas de morte daquele tempo já planejavam com antecedência a morte de Jesus. Não podemos pensar que a paixão era algo predestinado, mas fruto de sua escolha pela vida. Tanto é que, nas tentações do deserto, Jesus faz a opção em continuar com o projeto do Reino. O  “Pai se possível afasta de mim este cálice” (Mt 26,39, é o agravamento da sua agonia. O processo de sofrimento terreno de Jesus abre a porta da acolhida de Deus, especialmente, para com os que mais sofrem. Em tempos de coronavírus, todos nós, pessoas que acreditam na força da fé e da esperança em Deus temos o dever de agir e de pedir ao pai que livre desse cálice todas as pessoas que vivem em situações de maiores vulnerabilidades a essa doença. É tempo de resgatar aqueles valores que nos dão a identidade cristã os quais Jesus viveu e anunciou e por isso morreu na cruz: a compaixão, a solidariedade e o cuidado.
Continuemos, todos juntos, superando caminhos de morte e construindo caminhos de esperança e vida.
Rev. Luiz Pereira dos Santos 
 Igreja Presbiteriana Unida de Caetité-BA




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